Denomina-se
consciência fonológica a habilidade metalinguística de tomada de consciência
das características formais da linguagem. Esta habilidade compreende dois
níveis:
1. A
consciência de que a língua falada pode ser segmentada em unidades distintas,
ou seja, a frase pode ser segmentada em palavras; as palavras, em sílabas e as
sílabas, em fonemas.
2. A
consciência de que essas mesmas unidades repetem-se em diferentes palavras faladas.
(Byrne e Fielding-Barnsley, 1989).
Diferentes pesquisas
têm apontado o papel do desenvolvimento da consciência fonológica para a
aquisição da leitura e escrita. Estas pesquisas referem que o desempenho das
crianças na fase pré-escolar em determinadas tarefas de consciência fonológica
é preditivo de seu sucesso ou fracasso na aquisição e desenvolvimento da
lecto-escrita (Juel, Griffith e Gough, 1986; Stanovich, Cunningham e Cramer, 1984;
Capovilla, 1999; Guimarães, 2003). Crianças com dificuldades em consciência
fonológica geralmente apresentam atraso na aquisição da leitura e escrita, e
procedimentos para desenvolver a consciência fonológica podem ajudar as
crianças com dificuldades na escrita a superá-los (Capovilla e Capovilla, 2000).
A consciência
fonológica, ou o conhecimento acerca da estrutura sonora da linguagem,
desenvolve-se nas crianças ouvintes no contato destas com a linguagem oral de
sua comunidade. É na relação dela com diferentes formas de expressão oral que
essa habilidade metalinguística desenvolve-se, desde que a criança se vê imersa
no mundo linguístico. Diferentes formas linguísticas a que qualquer criança é
exposta dentro de uma cultura vão formando sua consciência fonológica, entre
elas destacamos as músicas, cantigas de roda, poesias, parlendas, jogos orais,
e a fala, propriamente dita.
As sub-halidades da
consciência fonológica são:
Rimas e aliterações
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Consciência de palavras
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Consciência silábica
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Consciência fonêmica
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Rima e Aliterações
A rima representa a
correspondência fonêmica entre duas palavras a partir da vogal da sílaba
tônica. Por exemplo, para rimar com a palavra SAPATO, a palavra deve terminar
em ATO, pois a palavra é paroxítona, mas para rimar com CAFÈ, a palavra precisa
terminar somente em È, visto que a palavra é oxítona. A equidade deve ser
sonora e não necessariamente gráfica, ou seja, as palavras OSSO e PESCOÇO
rimam, pois o som em que terminam é igual, independente da forma ortográfica.
Já a aliteração,
também recurso poético, como a rima, representa a repetição da mesma
sílaba ou fonema na posição inicial das palavras. Os trava-línguas são um bom
exemplo de utilização da aliteração, pois repetem, no decorrer da frase, várias
vezes o mesmo fonema.
Os pesquisadores Goswami
e Bryant (1997) realizaram estudos a respeito da consciência fonológica e
comprovaram que a habilidade de detectar rima e aliteração é preditora do
progresso na aquisição da leitura e escrita. Isto ocorre, porque a capacidade
de perceber semelhanças sonoras no início ou no final das palavras permite
fazer conexões entre os grafemas e os fonemas que eles representam, ou seja,
favorece a generalização destas relações.
É comum vermos
crianças de 4 ou 5 anos brincando com nomes dos colegas em jogos de rimas como:
"Gabriel cara de pastel, Fabiana cara de banana". Mesmo sem saber que
isto é uma rima, a brincadeira espontânea das crianças atesta sua capacidade de
consciência fonológica.
Consciência de
palavras
Também chamada de
consciência sintática, representa a capacidade de segmentar a frase em palavras
e, além disso, perceber a relação entre elas e organizá-las numa sequência que
dê sentido. Esta habilidade tem influência mais precisa na produção de textos e
não no processo inicial de aquisição de escrita. Ela permite focalizar as
palavras enquanto categorias gramaticais e sua posição na frase. Contar o
número de palavras numa frase, referindo-o verbalmente ou batendo uma palma
para cada palavra, é uma atividade de consciência de palavras. Por exemplo: Quantas
palavras há na frase: "O cachorro correu atrás do gato?" Ao responder
corretamente esta questão ou batendo uma palma para cada palavra, enquanto
repete à frase, a criança demonstra sua habilidade de consciência sintática.
Além disso, ordenar corretamente uma oração ouvida com as palavras desordenadas
também é uma capacidade que depende desta habilidade.
Déficit nesta
habilidade pode levar a erros na escrita do tipo aglutinações de palavras
e separações inadequadas. Embora esses erros sejam comuns no processo
inicial de aquisição da escrita, como por exemplo, escrever: OGATO
(aglutinação) ou SABO NETE (separação), a persistência destes tipos de erros
pode ser motivada por uma dificuldade de consciência sintática. Esta habilidade
implica numa capacidade de análise e síntese auditiva da frase.
Consciência da sílaba
Consiste na capacidade
de segmentar a palavras em sílabas. Esta habilidade depende da capacidade de
realizar análise e síntese vocabular. Segundo o dicionário Michaelis, a análise é
a decomposição em elementos constituintes (neste caso, a sílaba) e a síntese é a operação mental pela qual se
constrói um sistema; agrupamento de fatos particulares em um todo que os
abrange e os resume (aqui, a
palavra).
Zorzi (2003) faz uma
análise da psicogênese da escrita relacionando-a com o desenvolvimento das
habilidades de consciência fonológica. Segundo o autor, a criança só avança
para a fase silábica de escrita (de acordo com a classificação de Emília
Ferrero), quando se torna atenta às características sonoras da palavra,
especialmente quando ela chega ao nível do conhecimento da sílaba.
Atividades como contar
o número de sílabas; dizer qual é a sílaba inicial, medial ou final de uma
determinada palavra; subtrair uma sílaba das palavras, formando novos
vocábulos, é dependente esta sub-habilidade da consciência fonológica.
Consciência fonêmica
Consiste na capacidade
de analisar os fonemas que compõe a palavra. Tal capacidade, a mais refinada da
consciência fonológica, é também a última a ser adquirida pela criança.
É no processo de
aquisição da escrita que esse tipo específico de habilidade passa a se
desenvolver. As escritas de um sistema alfabético, como o português, o inglês e
o francês, por exemplo, permitem que os indivíduos tomem contato com as
estruturas mínimas da linguagem: os fonemas; o que não é possível num sistema
de escrita silábico ou ideográfico.
Desta forma,
percebemos que um certo nível de consciência fonológica é imprescindível para a
aquisição da lectoescrita, ao mesmo tempo em que, com domínio da escrita, a
consciência fonológica se aprimora. Ou seja, estágios iniciais da consciência
fonológica contribuem para o desenvolvimento dos estágios iniciais do processo
de leitura e estes, por sua vez, contribuem para o desenvolvimento de
habilidades de consciência fonológicas mais complexas.
Atividades como dizer
quais ou quantos fonemas formam uma palavra; descobrir qual a palavra está
sendo dita por outra pessoa unindo os fonemas por ela emitidos; formar um novo
vocábulo subtraindo o fonema inicial da palavra (por exemplo, omitindo o fonema
/k/ da palavra CASA, forma-se a palavra ASA), são exemplos em que se utiliza a
consciência fonêmica.
A consciência
fonológica associada ao conhecimento das regras de correspondência entre
grafemas e fonemas permite à criança uma aquisição da escrita com maior
facilidade, uma vez que possibilita a generalização e memorização destas
relações (som-letra).
Como referi
anteriormente, muitas pesquisas apontam que grande parte das dificuldades das
crianças na leitura e escrita está relacionada com problemas na consciência
fonológica. Partindo desta afirmação podemos derivar algumas implicações
educacionais.
Tais estudos sugerem
que a crianças e jovens com dificuldades de aprendizagem de leitura e escrita
devem participar de atividades para desenvolver a consciência fonológica,
em programas de reforço escolar ou terapias com profissionais
especializados, como fonoaudiólogo ou psicopedagogo. Além disso, as escolas
podem desenvolver desde a pré-escola, atividades de consciência fonológica com
objetivo preventivo, a fim de minimizar as possíveis dificuldades futuras na
aquisição da escrita (Guimarães, 2003).
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